Motta enfrenta crise e desgaste no primeiro ano na Câmara

Motta enfrenta crise e desgaste no primeiro ano na Câmara
Motta enfrenta crise e desgaste no primeiro ano na Câmara Hugo Motta [1] (Republicanos-PB), eleito em fevereiro com o respaldo do PT e do PL, completou seu primeiro ano como presidente da Câmara dos Deputados em um ambiente marcado por crises políticas, tensões institucionais e dificuldades de articulação. A tentativa de Motta de imprimir um perfil equilibrado à condução da Casa ocorreu em meio a atritos com diferentes forças partidárias, conflitos com outros Poderes e à paralisação de uma agenda própria de propostas. Ao longo de 2025, a Câmara viveu episódios inéditos que desafiaram diretamente a autoridade de Motta. Entre os mais emblemáticos estiveram um motim bolsonarista que se estendeu por mais de 30 horas no plenário e a retirada à força do deputado suspenso Glauber Braga [2] (PSOL-RJ), episódio que envolveu censura e agressões da polícia legislativa contra profissionais da imprensa. Mesmo sob críticas de parlamentares de variados espectros ideológicos e diante da avaliação recorrente de que não detém pleno controle da Casa, Motta ainda é visto por líderes partidários como um nome natural para a recondução ao cargo em 2027, desde que consiga se reeleger deputado federal em 2026. Ao fim do ano legislativo, Motta mantinha o apoio do principal bloco parlamentar, formado por partidos do centrão e composto por 276 deputados — número que exclui as duas maiores bancadas da Casa, o PL, com 86 parlamentares, e a federação do PT, com 80. A crise de imagem que atingiu o Congresso em 2025 também recaiu sobre Motta, reativando protestos da esquerda contra a anistia aos acusados de envolvimento nos atos golpistas de 8 de Janeiro e contra a PEC da Blindagem, proposta que condicionava o processamento criminal de parlamentares à autorização do Legislativo. Ao mesmo tempo, Motta foi pressionado pela agenda da direita em meio ao julgamento e à prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e às sanções impostas pelo então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Coube à Câmara, nesse contexto, deliberar sobre as cassações de Carla Zambelli [3](PL-SP), Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Alexandre Ramagem (PL-RJ) [4], além de punir os parlamentares envolvidos no motim bolsonarista — decisões que ficaram pendentes ao longo do ano, ampliando a percepção de fragilidade da gestão Motta. Motta entre o Planalto, o STF e um Legislativo fragilizado Câmara dos Deputados A relação entre a Câmara e o governo Lula (PT) terminou 2025 em patamar mais elevado, especialmente após a nomeação de um aliado de Motta para o Ministério do Turismo. O cenário foi oposto no relacionamento com o Supremo Tribunal Federal (STF), desgastado após uma sequência de operações policiais autorizadas pela Corte contra parlamentares, envolvendo emendas e uso da cota parlamentar. Em dezembro, quatro operações foram deflagradas em uma única semana. O desgaste com o Judiciário se aprofundou quando o STF reverteu a decisão da maioria da Câmara que havia optado por não cassar o mandato de Zambelli, colocando Motta em posição delicada diante dos ministros. Líderes partidários passaram a classificar o momento como o de um “Legislativo apequenado”. O ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), que patrocinou a eleição do sucessor e ainda exerce influência nos bastidores, chegou a definir a condução dos trabalhos como uma “esculhambação”. Em seu balanço público do primeiro ano de gestão, Motta afirmou que houve convergência em diversos temas, apesar do ambiente contaminado pela polarização política e pela disputa eleitoral. Disse adotar um perfil conciliador e defendeu a moderação como resposta ao extremismo. Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados A gestão, contudo, foi atravessada por controvérsias pessoais. Em 2025, vieram à tona denúncias sobre a existência de três funcionárias fantasmas e do caseiro de uma fazenda de Motta lotados em seu gabinete, além da informação de que sua chefe de gabinete possuía procuração para movimentar contas de funcionários. Após meses evitando esclarecimentos públicos, Motta afirmou apenas que o episódio estava superado. Em 2026, ano eleitoral que encurta o funcionamento do Congresso, Motta deverá lidar com pendências herdadas de 2025, como a PEC da Segurança, o projeto de lei Antifacção e a reforma administrativa. O governo também deve insistir em novas promessas, como o fim da escala de trabalho 6x1. No plano político e familiar, Motta terá ainda a missão de atuar pela eleição de seu pai, o prefeito de Patos (PB), Nabor Wanderley (Republicanos), ao Senado — movimento que poderia ser facilitado com o apoio do presidente Lula. Lula Marques/ Agência Brasil Espremido entre as demandas conflitantes de governo e oposição, Motta adotou ao longo do ano a estratégia de alternar acenos aos dois lados sob o argumento da moderação. O resultado, porém, foi o de crescente insatisfação generalizada. No caso do projeto Antifacção, por exemplo, priorizou a proposta enviada pelo Executivo, mas nomeou como relator o oposicionista Guilherme Derrite (PP-SP), o que transformou o texto em um campo de batalha e levou ao adiamento da votação. Motta também tentou avançar com uma agenda própria ambiciosa, incluindo a reforma administrativa, a adoção do voto distrital misto e o fim da cobrança por bagagem de mão em voos, mas todas as iniciativas terminaram o ano paralisadas. Em contrapartida, atendeu pautas do governo Lula ao aprovar medidas econômicas prioritárias, como isenções do Imposto de Renda, a tarifa social de energia e a tributação de bets e fintechs. Também tentou atender à oposição ao pautar a anistia e ao centrão ao encampar a PEC da Blindagem. [5] No caso da anistia, Motta acabou contrariando o bolsonarismo ao participar de um acordo com o STF que transformou o perdão total em redução de penas para Bolsonaro e os condenados do 8 de Janeiro. A proposta aprovada pelo Congresso deve ser vetada por Lula. Já a PEC da Blindagem custou caro politicamente aos deputados e foi enterrada no Senado, expondo falhas de articulação com o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). Apesar do fracasso da PEC, Motta conseguiu aprovar outras demandas corporativas do Legislativo, como a fixação de um recorde de R$ 61,4 bilhões em emendas parlamentares para 2026 e um calendário de pagamento desses recursos. Ainda assim, predominou entre os parlamentares a queixa de lentidão na liberação das verbas pelo governo. Ao final do ano legislativo, a avaliação predominante entre líderes partidários foi a de que, novamente, faltou a Motta articulação suficiente para pactuar decisões sensíveis com a maioria da Câmara, com o Senado e com os demais Poderes da República. [1] https://www.camara.leg.br/deputados/160674 [2] https://abcdoabc.com.br/glauber-braga-mesa-diretoria-camara-retirado-forca/ [3] https://abcdoabc.com.br/carla-zambelli-renuncia-mandato-deputada-federal/ [4] https://abcdoabc.com.br/eduardo-bolsonaro-ramagem-mandatos-cassados-motta/ [5] https://abcdoabc.com.br/pec-da-blindagem-protege-parlamentares/